Coleção Clássica DIBICA

Todos os artigos criados ou enviados durante os primeiros vinte anos do projeto, de 1995 a 2015.

Anuarite Nengapeta

Nomes alternativos: Maria-Clementina
1939-1964
Igreja Católica
República Democrática do Congo

Anuarite Marie-Christine

Anuarite nasceu em Wamba (D.R. Congo) em 29 de dezembro de 1939. Ela pertencia a tribo Wabudu. Seu pai era Amisi Batsuru Batobobo e sua mãe Isude Julienne. Anuarite era a quarta filha, após a sexta filha o seu pai (ex soldado) deixou sua mãe e tomou outra esposa que talvez lhe daria o filho homem. Mas ele teve azar na sua escolha pois a segunda esposa era estéril. A pesar das dificuldades de ter pais divorciados, Anuarite perdoou seu pai de todo coração.

Os paia da Anuarite erram pagãos. No entanto, sua mãe foi batizada no mesmo dia que ela em 1945. o nome de batismo de Anuarite era Afonsina. Parece que ela foi batizada duas vezes simplesmente porque o seu certificado original de batismo foi perdido.

O nome Nengapeta significa “a riqueza engana”. Anuarite, que significa “a que ri da guerra”, de fato era o nome de sua irmã e ela o recebeu devido a um erro eclesiástico. Certo dia, Leontina Anuarite levou sua pequena irmã Nengapeta Afonsina para inscreve-la na escola; a irmã belga que as atendeu não era consciente da etnologia e filosofia africanas ou quem sabe estava distraída. Seja com for, quando ela viu Leontina Anuarite alí para inscrever sua irmã ela registrou a pequena menina como Afonsina Anuarite. Desse dia em diante o nome de Nengapeta foi perdido e não aparece no resto da historia de Anuarite.

Anuarite era uma criança sensível. Uma vez pós ver um cabrito ser carneado, Anuarite se negou a comer a carne, dizendo que o sangue era igual ao dela. Ela era também muito prestativa e depois da escola adorava ajudar a sua avó com as tarefas.

Mesmo sendo uma pequena menina, Anuarite desejava ser freira e despertou o mesmo desejo em suas amigas. Ela admirava as freiras da sua vila e queria seguir nas suas pegadas. A irmã Ndakala Ana Maria, a sua professora da terceira serie passou a ser uma mãe espiritual para ela.

No começo a mãe de Anuarite foi contra o seu desejo de ser freira. Mas Anuarite não foi facilmente dissuadida e por si própria pediu para ser aceita no convento. Entretanto, as irmãs se negaram a aceita-la pois era muito jovem naquele momento.

Certo dia, um caminhão chegou na missão para levar as candidatas ao convento em Bafwabaka e Anuarite aproveitou a oportunidade para subir-se ao caminhão sem ser vista. A sua mãe a procurou por vários dias e só descobriu o seu paradeiro através de um menino da vila. Mesmo tendo Anuarite fugido a sua mãe não a obrigou a voltar pra casa.

Depois de muitos dias no convento Anuarite fez seus votos em 5 de agosto de 1959 e tornou-se a Irmã Maria Clementina. Seus pais estavam presentes na cerimônia e deram dois cabritos como presente para as irmãs como demonstração de seu orgulho por sua filha ter se consagrado a Deus. Contudo, mais tarde, a sua mãe tentou persuadir sua filha a renunciar sua vocação e voltar pra casa para ajudar a família financeiramente.

Na sua vida no convento, Anuarite dedicou-se a servir aos outros a faze-los feliz. Ela até assumia tarefas que outros evitavam. Assim mesmo, as vezes ela chamava atenção abertamente daqueles que fugiam do trabalho. Ela fez voto de jamais pertencer a nenhum homem e queria que as outras irmãs mantivessem o mesmo voto. Certo dia, furiosa de braba, ela atacou um vagabundo que estava cantando uma de suas freiras.

Em 1964, estourou a rebelião de Mulele e em poucas semanas tomou conta de todo o pais. Os rebeldes Simba perseguiram os estrangeiros mas também os monges e freiras nativos pois suspeitavam que eles estivessem em cumplicidade com os estrangeiros. No dia 29 de novembro de1964 eles chegaram ao convento de Bafwabaka e carregaram as 46 freiras num caminhão e as levaram para Wamba. As freiras foram informadas que a mudança era por razões de segurança. Não obstante, o caminhão mudou de rumo e foi para Isiro onde as freiras foram levadas para a casa do Coronel Yuma Déo.

Naquela noite, todas as irmãs exceto a Irmã Anuarite mudaram novamente, desta vez para uma casa próxima chamada de “casa azul”. Um dos líderes Simba, Coronel Ngalo, com a ajuda de um soldado de nome Sigbande, tentou convencer Anuarite a tornar-se sua esposa. Temerosa mas desafiante ela recusou-se categoricamente repetidas vezes mesmo depois que os soldados furiosos a isolaram e ameaçaram de morte. A Madre Leontina tentou defende-la mas em vão.

Entretanto, as outras freiras na casa azul se recusaram a comer sem a presença da sua madre superiora. O Coronel Pierre Olombe trouxe consigo as irmãs Banakweni e Marie-Lucie, para informar desta situação ao Coronel Ngalo que requisitou a sua ajuda para seduzir Anuarite. Seguro do seu sucesso Olombe aceitou o pedido.

No jantar Anuarite compartilhou um prato de arroz e sardinhas com a Madre Xavéria mas não conseguiu comer muito. Ela alertou suas irmãs a não tomar de cerveja oferecida pelos Simbas, pois estariam em risco de morte. Ela declarou que estava disposta a morrer defendendo a sua virgindade.

Mais tarde, essa mesma noite, o Coronel Olombe e um grupo de Simbas mandaram as freiras dormir e permitiram que todas dormissem num mesmo quarto com tal que Anuarite ficasse com eles. Muito perturbada e ansiosa Anuarite pediu a sua madre superiora que rezasse por ela. Olombe novamente pressionou para que ela acedesse ao desejo de Ngalo. Depois mudou de idéia e decidiu que ele queria Anuarite para si próprio. Quando ela recusou categoricamente, ele proferiu insultos atacando-a, mas ela se manteve desafiante.

Então o coronel forçou a entrar num automóvel a Irmã Anuarite e a Irmã Bokuma Jean-Baptiste, a quem ele queria para si mesmo. Anuarite e a Irmã Jean-Baptiste, tentaram fugir enquanto Olombe pegava as chaves do carro na casa. Lamentavelmente ele as pegou e uma luta feroz aconteceu. A Madre Leontina e a Madre Melanie que testemunhavam a cena imploraram ao coronel que tivesse misericórdia das duas freiras, mas o coronel estava furioso e as mandou calar.

O Coronel Olombe então começou a bater nas duas freiras. A Irmã Jean-Baptiste desmaiou, os seu braço quebrou em três partes, mas Anuarite continuou a resistir corajosamente dizendo que ela preferia morrer antes de cometer tal pecado. As suas palavras só instigaram a fúria de Olombe.

Debaixo de pancadas Anuariteteve forças para dizer: “ Eu lhe perdoou porque você não sabe o que está fazendo”. E num novo surto de raiva Olombe chamou alguns Simbas e ordenou que a apunhalassem com suas baionetas. Depois de vários golpes, Olombe tirou o seu revolver e a baleou no peito.

O coronel então parece que se acalmou um pouco e ordenou que as outras freiras viessem e levassem o corpo dela. Ainda respirando debilmente, Anuarite ainda agonizou por alguns minutos antes de morrer por volta da uma da madrugada do 1º de dezembro de 1964.

Anuarite foi enterrada numa vala comum com outros prisioneiros que foram executados pelos Simbas. Entretanto, oito meses mais tarde, seu corpo foi exumado e foi sepultado com honras no cemitério de Isiro próximo da catedral. Em 1999 ela tornou-se a primeira mulher congolesa a ser canonizada pela Igreja Católica.

Depois da rebelião, a Irmã Fidélia Sembo confirmou ter encontrado o Coronel Olombe em Kisangani. Ele tinha sido levado como prisioneiro pelo General Yossa Malasi do exército nacional do Congo em 1966 e sentenciado a morte por rebeldia. A sua sentença foi reduzida a cinco anos de prisão pois tinha lutado ao lado do exercito do Congo quando o mercenário belga Jean Schramme atacou o Congo em Bakavu; Olombe cumpriu a sentença na prisão de Ndolo.

Depois de ser solto, ele ficou na miséria e procurou as freiras para pedir comida, as mesmas freiras que ele tinha liberado após ter matado a sua colega em Isiro. A Irmã Leontina lhe deu comida e disse: “Se a Irmã Maria Clementina lhe perdoou, nos devemos seguir o exemplo dela.”

Yossa Way


Bibliografia

Agwala, Marie Jean, Evénements du Congo à Wamba, 15 Août-29 Décembre 1964 (Clermont-Ferrand: Imprimerie G. de Bussac, 1966).

Esposito, F. Rosario, Anuarite: Vierge et Martyre Zaïroise (Kinshasa: Ed. Saint-Paul Afrique, 1978).

Molandisi, M., Anuarite: Ngondo mpe Martiro; Mosaleli wa Nzambe, Mwana wa Zaïre (Kinshasa: Ed. Saint-Paul Afrique, 1978).

Otene Matungulu, The Spiritual Journey of Anuarite (Nairobi: St. Paul Communications/ Daughters of St. Paul, 1998).

Folheto recolhido na rua por este autor contendo a historia de sua vida. As páginas com o nome do autor e o lugar de publicação foram perdidos.


Este artigo, recebido em 2001, foi pesquisado e escrito pelo Rev. Yossa Way, parceiro do Projeto Luke e professor de teologia no Institut Supérieur Théologique Anglican na Bunia, República Democrática do Congo.

Este artigo foi traduzido da língua inglesa por Cloves Cardozo Carreira ([email protected]), tradutor e intéprete, Florianópolis, Santa Catarina, BRASIL.